Rosângela Silva, a Janja, Michelle Bolsonaro e Giselle Bezerra atuam de forma ativa nas candidaturas de seus maridos à Presidência da República. Lula(PT), Jair Bolsonaro (PL) e Ciro Gomes (PDT) têm a seu favor uma mudança em relação a eleições anteriores para atrair empatia, quebrar estigmas nas campanhas e atingir o maior segmento de eleitores brasileiros.
Mulheres representam 82,3 milhões do eleitorado apto a votar em 2 de outubro, data do primeiro turno. O total é 10 milhões maior do que o de homens, que são 74 milhões segundo a Justiça eleitoral. Desde a eleição de 2002, as mulheres são maioria no eleitorado.
Janja tem histórico na militância pelo PT –entrou no partido na década de 1980. Ela acompanhou Lula durante seu período preso em Curitiba (PR) e ajudou a popularizar novamente o jingle “Lula lá” — usado em campanhas passadas e repetido pelo petista em viagens pelo país nos últimos meses. Ela costuma cantar o jingle em eventos com Lula.
A esposa do petista apresentou a música no lançamento oficial da pré-campanha como um presente de casamento — Lula e Janja se casaram em 18 de maio, em São Paulo.Lula tem repetido em suas falas que o casamento é um sinal de que ele é um candidato do amor contra o ódio. Nestes momentos, Janja costuma estar no palco ao lado de outros políticos ligados à campanha.
Havia uma expectativa de que Michelle entraria na campanha de Bolsonaro à reeleição já em um vídeo institucional do PL, em junho, mas ela desistiu de última hora. A primeira-dama mudou a postura neste mês e tem participado ativamente da campanha. O ponto de virada ocorreu no lançamento oficial da candidatura de Jair Bolsonaro à reeleição, no Rio de Janeiro, em 24 de julho.
Evangélica, Michelle tem discursado e feito orações em eventos junto do atual presidente. Ela é vista como importante elemento para amenizar a reprovação de 61% que tem o presidente tem entre as mulheres — houve crescimento de Bolsonaro neste público, de 21% em junho para 27% das intenções de voto em julho, segundo o Datafolha. Lula tinha 49% entre esse público e oscilou para 46%, dentro da margem de erro da pesquisa, de dois pontos percentuais.
Na convenção que lançou a candidatura de Bolsonaro, em julho, por exemplo, Michelle disse que o marido sancionou leis de proteção à mulher.
O QG da campanha pela reeleição conta com a primeira-dama também para encontros, como reunião com empresárias.
Já Giselle Bezerra entrou oficialmente na campanha de Ciro Gomes no último domingo, uma mudança em relação à postura adotada em 2018. Os dois estão juntos há seis anos, mas Ciro não contava até então com sua participação oficial em materiais de campanha.
A esposa surge como reforço para Ciro tentar reduzir a vantagem que Lula e Bolsonaro têm na liderança das pesquisas de intenção de voto. Em vídeo postado nas redes sociais do candidato, Giselle rebate críticas de que Ciro Gomes tem postura agressiva ao lidar com outros postulantes ao Palácio do Planalto e apresentar suas propostas aos eleitores.
“Eu olho para o Ciro e falo assim: ‘eu não sei como você aguenta isso’. Um homem como você, do coração como o seu, de verdade como você é. Porque ele é de verdade. ‘Ah, destemperado’. Destemperado? Que destemperado, ele é indignado”, diz a companheira do candidato no material.
Giselle também tem estado com Ciro em suas viagens de pré-campanha, como visita à Bahia na quinta-feira (11).
Mudança de postura
A cientista política Vera Chaia, professora da Pontifícia Universidade Católica (PUC) de São Paulo, diz que a presença atual das companheiras dos candidatos à Presidência mostra uma nova forma de relação com as campanhas eleitorais.
“Não me lembro de cônjuges com esta atuação em campanhas. Mulheres dos candidatos costumam não ser muito participativas. Historicamente, não acontecia de maneira tão clara, explícita”, afirma.
A especialista cita como exemplo Marisa Letícia, primeira-dama de 2003 a 2010, que morreu vítima de um AVC em 2011. Segundo ela, a então companheira de Lula estava presente nos eventos, mas apenas para acompanhar o candidato.
Vera Chaia considera que as presenças mais efetivas de Janja, Michelle e Giselle têm motivos diferentes. Enquanto Janja busca manter a campanha do petista no “patamar mais efusivo”, as outras duas tentam atrair o voto feminino para Bolsonaro e Ciro, respectivamente.
“A relação está sendo essa, talvez pela necessidade de convencimento das mulheres, um segmento que é maioria da população e dos eleitores. Talvez seja um apelo para que haja um convencimento maior, principalmente no caso do Bolsonaro”, diz.
Papel das primeiras-damas
A professora conta que a atribuição exercida pelas primeiras-damas, como são chamadas as esposas dos chefes do Executivo, costuma se restringir a ser “acessório dos presidentes”. Isso se mantém ao longo da história na política brasileira, com essas mulheres cumprindo papel de representação feminina, embora sem poder decisório no governo.
“É mais um papel de solidariedade, empatia. Um caso brasileiro é o da dona Darcy Vargas (esposa de Getúlio Vargas, presidente nas décadas de 1930 e 1950). Ela tinha uma cultura de ser muito participativa em períodos de distribuição de cestas de Natal, presentes ou ovos de Páscoa, apenas. No regime militar, elas eram todas ignoradas, quem mandava eram os comandantes”, diz Vera.
Esta função foi modificada por Ruth Cardoso, primeira-dama nos dois governos de Fernando Henrique Cardoso, na década de 1990. “No caso da Ruth, foi diferente porque ela tinha envolvimento com movimentos sociais, um conhecimento sobre uma série de questões, pobreza, solidariedade. Isso fez com que os programas sociais do FHC fossem desenvolvidos por ela”, afirma.
A realidade se repete em outros países, como os Estados Unidos. Michelle Obama, primeira-dama de 2009 a 2017 durante o governo de Barack, foi um exemplo de esposa de presidente com atuação ativa — no caso, ao propor enfrentamento ao racismo.
Representação feminina
Dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) mostram que as mulheres são 51,8% da população, mas a representatividade não se reflete em cargos políticos. Na Câmara dos Deputados, mulheres ocupam 77 das 513 cadeiras (15% do total). Percentual similar aos 14% de representação no Senado (estão em 12 de 81 vagas).
Pela primeira vez desde a redemocratização, o Brasil terá duas chapas com candidatas à presidência e a vice formada por mulheres: Vera Lúcia/Raquel Tremembé (PSTU) e Simone Tebet (MDB)/Mara Gabrilli (PSDB).
Houve apenas uma outra oportunidade em eleições presidenciais com duas mulheres em uma mesma chapa. Em 2006, Ana Maria Rangel e Delma Gama concorreram pelo antigo Partido Republicano Progressista (PRP).
A Justiça Eleitoral tornou a cota de gênero obrigatória para a eleição deste ano. A lei estabelece que partidos precisam ter pelo menos 30% de candidatas mulheres, iniciativa para incentivar a participação feminina na política.
Fonte G1 Brasília