Antes do recesso parlamentar, o Congresso Nacional aprovou alguns projetos que podem interferir no financimento e nas negociações das eleições deste ano. Entre outros pontos, as propostas alteram regras para doações durante a campanha eleitoral, ampliam sigilo sobre o ‘orçamento secreto’ e permitem que o governo altere o destino de recursos já contratados.
A proposta que permite ao governo doar bens a entidades privadas e públicas durante todo o ano de 2022 foi aprovada em sessão do Congresso na última terça-feira (12), em votação relâmpago no plenário.
O texto modifica a Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) de 2022, que já abria exceção para bens doados pela administração pública a entidades privadas até três meses antes das eleições. Com a aprovação do projeto, a exceção foi ampliada para todo o ano, incluindo a entidades públicas, a possibilidade de doação de bens sem que a conduta configure crime eleitoral.
O dispositivo para permitir as doações dentro do período restrito pela legislação eleitoral foi incluído pelo relator, deputado Carlos Henrique Gaguim (União-TO), em um projeto que tratava do contingenciamento de recursos do Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (FNDCT).
O texto diz que é permitida a doação de bens, valores ou benefícios por parte da administração pública a entidades privadas e públicas durante todo o ano de 2022, desde que com encargo para o donatário, ou seja, o beneficiário da doação arque com os custos para a manutenção e funcionamento do bem recebido.
Ainda, segundo a proposta, essas doações não serão consideradas descumprimento da legislação eleitoral, que proíbe, expressamente, “a distribuição gratuita de bens, valores ou benefícios por parte da Administração Pública” em todo o ano eleitoral.
Atualmente, a exceção prevista em lei, é apenas para casos de calamidade pública, de estado de emergência ou de programas sociais autorizados em lei e já em execução orçamentária no exercício anterior.
A proposta foi aprovada antes do Congresso promulgar a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) que decretou o estado de emergência no país.
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Debates
A deputada Adriana Ventura (Novo-SP) criticou a proposta. Ela afirmou que o texto fere a lei eleitoral em vigor.
?Com este PLN, o que se está tentando fazer é doação o ano inteiro. Então, quer dizer, a gente doa em ano eleitoral. Isso está ferindo, sim, aquele princípio que temos de manter minimamente a lei eleitoral em vigor?, disse a deputada.
O senador Jean Paul Prates (PT-RN) disse que o Congresso autorizou algo expressamente proibido por lei.
?Alguma razão há de ter para estarmos aqui diante de um artigo jabuti desses aqui, que permite a doação de bens, valores e benefícios da administração pública para entidades privadas, em pleno ano eleitoral, quando exatamente isso é vetado pela Lei eleitoral?, afirmou.
Já o deputado Hildo Rocha (MDB-MA) defendeu a mudança e disse que a lei eleitoral está errada.
?O texto de fato permite a doação do poder público para o poder público. Digamos que determinado estado tenha ambulâncias para serem entregues aos municípios, ele autoriza que sejam entregues as ambulâncias?, afirmou. Até porque nós temos que mudar o que está lá na lei eleitoral. A lei eleitoral é que está errada?, acrescentou o deputado.
Alteração contratual
Deputados e senadores também aprovaram trechos que permitem ao governo alterar o objeto e a localidade da execução de recursos já contratados.
Na prática, isso permite que recursos alocados em um município sejam destinados a outro local, o que pode virar moeda de troca em ano eleitoral.
Segundo a consultoria de Orçamento da Câmara ?permitir alteração na localidade de execução do objeto inicialmente pactuado contraria, em tese, princípios previstos na legislação de regência de licitações e contratos administrativos, como os do interesse público, do planejamento, da motivação e da vinculação ao edital, entre outros, o que, em certa medida, pode levar à sua descaracterização?.
Outro trecho permite o pagamento a fornecedores diferentes daqueles previstos nas respectivas notas de empenho. Empenho orçamentário é a etapa em que o governo reserva o dinheiro que será pago quando o bem for entregue ou o serviço concluído.
Segundo o texto, na hipótese de desistência do fornecedor original ou de rescisão contratual, a despesa poderá ser paga em favor de credor diferente do indicado na respectiva nota de empenho desde que seja vantajoso para a administração pública.
Em nota, a Consultoria de Orçamento da Câmara e do Senado também criticou este ponto. Segundo os técnicos, é necessário emitir uma nova nota de empenho e não mudar o fornecedor inscrito.
?Outro credor que eventualmente possa vir a fornecer o bem ou o serviço que a administração pública esperava do credor inadimplente deverá ser pago não à conta do orçamento anterior (restos a pagar), mas do orçamento então vigente, sendo indispensável a emissão de nova nota de empenho?.
?Orçamento Secreto?
Durante a mesma sessão, os parlamentares deram aval a uma proposta que permite “ocultar” a identificação dos parlamentares responsáveis por indicar emendas de relator que, posteriormente, forem remanejadas para outras áreas do orçamento federal.
As emendas de relator ganharam o apelido de “orçamento secreto”, em 2021, em razão da dificuldade em apontar quem era o deputado ou senador responsável pela indicação das verbas. Desde então (veja detalhes abaixo), regras foram criadas para dar mais transparência a esses recursos.
O projeto aprovado nesta terça, porém, abre um novo caminho para que essas assinaturas permaneçam sob sigilo. O texto prevê que, se as emendas forem remanejadas ? por exemplo, para a parcela do orçamento cujo uso é definido pelo governo ?, a indicação dos valores e dos autores não será mais necessária.
https://g1.globo.com/politica/noticia/2022/07/12/orcamento-secreto-congresso-aprova-ocultar-autoria-de-emendas-de-relator-que-sejam-remanejadas.ghtml
Fonte G1 Brasília