Um atrito entre o ministro da Justiça e Segurança Pública, Ricardo Lewandowski, e integrantes da Frente Parlamentar Evangélica ajudou a sacramentar a derrota do governo nesta terça-feira (28). Com quase três quintos dos deputados e dos senadores, o Congresso Nacional derrubou o veto do presidente Luiz Inácio Lula da Silva à proibição da saidinha de presos no regime semiaberto.
Os articuladores políticos da gestão Lula vinham negociando com a bancada evangélica a manutenção da saidinha. Inicialmente, contavam que esses parlamentares, ao menos, não orientassem votação pela derrubada do veto. No final, o placar foi de 314 contra o governo, 120 favoráveis e duas abstenções na Câmara e, no Senado, 52 contra, 11 a favor e uma abstenção.
??O estopim do desentendimento foi a resolução nº 34 do Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária (CNPCP), vinculado à pasta, publicado no dia 24 de abril. A medida proibiu o proselitismo religioso nas penitenciárias. Proselitismo é o nome dado à busca ativa de uma religião por novos fiéis.
Os parlamentares entendem que a norma dificulta a atuação de pastores e a possibilidade de conversão dos presos.
Parlamentares da bancada evangélica e da Frente da Segurança Pública relataram terem se reunido com o Ministério da Justiça para pedir a supressão de três trechos desra resolução. Receberam como resposta que a pasta poderia editar uma nota interpretativa, mas não exclui-los.
O apoio massivo à derrubada do veto teria sido, de acordo com esses parlamentares, um recado ao governo.
Interlocutores de Lewandowski negam essa versão. Afirmam que o ministro explicou não ter ingerência sobre as ações do CNPCP. Para suprimir os trechos, seria necessário uma nova rodada de audiências públicas e outra reunião dos conselheiros, o que poderia retardar o processo. A nota interpretativa foi sugerida como uma solução mais rápida e, segundo integrantes da pasta, teria sido aceita pelos parlamentares. Eles ficaram de enviar as sugestões por escrito, o que não fizeram, segundo essas fontes, para poder manter a narrativa contra a gestão Lula.
Após a reunião, o ministro gravou um vídeo ao lado dos deputados e senadores. “Os problemas que nos foram apresentados serão examinados com muito cuidado, com muita verticalidade e certamente haverão de ser resolvidos”, diz o ministro. O senador Carlos Viana (Podemos-MG), presidente da frente evangélica no Senado, menciona a remessa dos ajustes por escrito. “Daqui saímos com a proposta de apresentarmos as nossas dúvidas em texto para que ser corrigido juntamente com toda a equipe do Ministério da Justiça.”
Na época em que a resolução foi publicada, o presidente do CNPCP, Douglas de Melo, negou que a norma referendasse qualquer tipo de perseguição religiosa. ?Aliás, pelo contrário, pois ao longo dos debates realizados no processo de construção do documento, o CNPCP sempre se mostrou atento à necessidade de evidenciar a importância das garantias de liberdade de consciência e de crença e de livre exercício, em igualdade de condições, dos cultos religiosos. Nós reprovamos qualquer tipo de comportamento que coloque esse direito em risco?, declarou.
Parlamentares da frente evangélica destacam três pontos da resolução como críticos. O primeiro assegura a atuação de diferentes grupos religiosos nos presídios “em igualdade de condições, majoritárias e minoritárias” e proíbe o proselitismo religioso e “qualquer forma de discriminação, de estigmatização e de racismo religioso”.
Os outros dois pontos proíbem o agente voluntário de ser servidor público, privado ou profissional liberal do presídio ou de possuir familiares ou parentes de até segundo grau presos na unidade na qual pretenda realizar a atividade religiosa.
Ricardo Lewandowski foi uma voz dissonante dentro do governo a favor de que Lula vetasse a proibição da saidinha para presos no regime semiaberto. Por ter sido aprovado com apoio expressivo do Congresso, a ala política da gestão defendia a manutenção do texto dos parlamentares como uma forma de não aprofundar os atritos.
Prevaleceu, no entanto, o entedimento de Lewandowski, de que não seria possível retroceder à uma prática permitida até durante a ditadura militar.
Fonte G1 Brasília