REDES SOCIAIS

31°C

Da bomba atômica a segredos de Estado: a verdadeira história do glitter, que intriga a internet

Share on facebook
Share on twitter
Share on telegram
Share on whatsapp
Share on email
window.PLAYER_AB_ENV = “prod”

Maquiagem, fantasias e diferentes tipos de ornamentos. No Carnaval, presença quase obrigatória. O glitter pode até se tornar uma obsessão para quem gosta de tornar tudo um pouco mais brilhante.

Só que, para além das aplicações mais convencionais, uma popular teoria da internet sugere que o glitter esteja sendo usado pela indústria alimentícia, de armas e até em tecnologias secretas, protegidas por segredos de Estado.

? Como começaram as teorias? Tudo começou com uma reportagem que saiu em dezembro de 2018 no americano “The New York Times”, intitulada “What is glitter?” (“O que é glitter?”). Na época, uma grande fabricante de glitter dos Estados Unidos causou estranhamento ao não revelar à publicação quem eram seus maiores clientes, dizendo que eles não gostariam de tornar público o fato de seus produtos conterem glitter na composição. O sigilo abriu espaço para especulações sobre quem seriam os secretos compradores da mercadoria e para que seria usada.

? As teorias voltaram com força nos últimos meses, impulsionadas por vídeos publicados no TikTok.

Naiara Cândido, que criou em 2016 a marca brasileira Contém Glitter, disse ter se surpreendido com o alvoroço em torno do tema: “Quando os meus amigos começaram a mandar esses vídeos do TikTok, pensei: ‘Que maluquice é essa? Por que essa empresa inventou esse segredo?'”.

No ano seguinte à fundação da empresa, Cândido foi à China para negociar a importação de uma remessa de glitter. Lá, visitou o chão de fábrica de três grandes exportadoras locais, mas não encontrou nada anormal.

“Nas fábricas que visitei, acompanhei a produção do glitter ao longo de todas as etapas. Inclusive, vi glitter no microscópio, o que me ajudou a escolher a fornecedora da minha marca. Então, a não ser que o processo nos Estados Unidos seja completamente diferente do chinês, não vejo sentido [na polêmica atual]”, diz.

Leia, mais abaixo nesta reportagem, sobre estes três temas:

  • Afinal de contas, o que é o glitter?
  • O glitter e a bomba atômica
  • A linha do tempo da “conspiração” em torno do glitter
  • A conspiração… que não é tão conspiração assim

Mas, afinal de contas, o que é o glitter?

O glitter é produzido a partir de um pedaço de plástico, com revestimento de alumínio metalizado, que pode ter diversas cores.

“Se o glitter reflete a cor azul ou cobre, isso acontece porque o alumínio, que reveste o rolo de plástico, recebe essas colorações através de um processo que requer calor. Esse rolo é depois fatiado por máquinas de corte de precisão, na espessura e no formato desejado”, diz Cândido.

A composição química da película de plástico varia conforme a aplicação do glitter. Por exemplo, o glitter presente em esmalte tem uma película de plástico mais resistente a solventes químicos do que a fórmula usada para maquiagens.

Além disso, é possível conferir brilhos distintos ao material. “Tem o brilho metálico, holográfico (que muda a cor conforme a direção muda) ou iridescente (efeito escama de peixe)”, cita Cândido.

Por ser um microplástico praticamente indestrutível — é estimado que o glitter demore cerca de um milênio para se desfazer na natureza. Nas fórmulas sustentáveis e biodegradáveis, a película de plástico é substituída por celulose.

Estados Unidos, China e Europa são os polos produtores de glitter no mundo. Segundo Naiara Cândido, as empresas brasileiras que desejam obter o material para suas linhas comerciais, precisam importá-lo.

“Quando faço as importações, eu divido contêineres com outros compradores. Durante um tempo, a maior cliente de glitter do Brasil foi a Grendene, que usava na sandália Melissa”, informa.

Mas quem vê o amplo emprego do glitter nos dias de hoje pode se surpreender com a história nada trivial das partículas brilhantes. Elas estão conectadas, inclusive, à arma militar mais letal de que se tem conhecimento: a bomba atômica.

O glitter e a bomba atômica

Revelações sobre a história do glitter podem ser encontradas no artigo “The discovery, development of glitter”, que saiu em 2021 na revista “Paper, Film & Foil Converter”, uma publicação de nicho sobre a indústria de papel e filmes dos Estados Unidos. Segundo o texto, a invenção das partículas remonta ao imigrante alemão naturalizado americano Henry W. Ruschmann.

Na década de 1930, Ruschmann criou e patenteou uma máquina de corte de precisão de alta velocidade, com a finalidade de cortar rolos de filme fotográfico.

?? A expertise de Ruschmann com esse tipo de maquinário atraiu o interesse do governo dos Estados Unidos no início da década de 1940, que o convidou para ser um dos colaboradores do Projeto Manhattano programa militar norte-americano que culminou no desenvolvimento da bomba atômica.

Sob o contrato governamental, o imigrante alemão desenvolveu métodos para cortar mica, um grupo mineral com aparência brilhante.

? Tais peças criadas a partir do material serviam para segurar hastes de plutônio que, ao entrar em contato com dinamite e urânio 235 nos reatores, desencadeavam a explosão nuclear.

Durante o corte, o pó cintilante de mica caía no chão do redor de onde estava instalada a máquina. E assim foi criado o primeiro glitter comercial do mundo: um subproduto acidental de um dos projetos militares mais consequentes da história.

O uso do pó de mica como ornamento tornou-se um dos produtos principais da Meadowbrook Farm Inventions (MFI), a empresa fundada por Henry W. Ruschmann após o fim da Segunda Guerra Mundial e que foi controlada por seu filho até a década de 1990.

Com o passar das décadas, a companhia foi testando e desenvolvimento novas fórmulas para o produto. Segundo Naiara Cândido, hoje em dia o pó de mica é usado para fazer purpurina, um material mais fino e menos brilhante que o glitter.

Embora esteja vinculada à invenção do glitter e tenha liderado o mercado no século XX, a MFI perdeu o protagonismo no segmento de glitter cosmético para outras companhias dentro e fora dos EUA.

A revelação veio do ex-CEO e filho do imigrante alemão Henry F. Ruschmann, em um entrevista concedida a dois jornalistas no ano passado. “Na década de 1990, esta companhia valia R$ 40 milhões, hoje vale menos que 10% disso”, disse.

A linha do tempo da ‘conspiração’

O mistério envolvendo o glitter teve início no final de 2018, quando a repórter Caity Weaver, do New York Times, foi à fábrica da Glitterex, a concorrente que suplantou a MFI como maior fornecedora de glitter nos Estados Unidos.

A visita ao local acabou gerando um suspense inesperado. Em determinado ponto da reportagem, Weaver relata não ter conseguido autorização para ver a sala de máquinas, de onde ouvia “barulhos intensos”. Posteriormente, tentou perguntar à funcionária que a acompanhava quem seriam os principais clientes da indústria do glitter.

“Não posso dizer”, respondera a representante, justificando que os clientes da Glitterex não gostariam de revelar que seus produtos continham as partículas brilhantes em sua composição.

A partir daí, o tema da fabricação do glitter passou a alimentar diversas teorias e especulações na internet.

A repercussão digital do caso inspirou jornalistas a irem atrás de uma resposta à charada deixada pela repórter do “New York Times”, mas nenhum deles conseguiu solucioná-la.

Quem mais próximo chegou da misteriosa lista de clientes da Glitterex foram os jornalistas Ben Brock Johnson e Amory Sivertson, do podcast Endless Thread, veiculado pela NPR. Em um episódio veiculado em 2021, os jornalistas contataram um dos clientes da companhia, que trabalhava com pintura de cascos de embarcações.

Apesar de ser uma aplicação menos óbvia, a venda de glitter para a indústria naval não é exatamente um segredo — é um dos contratos admitidos publicamente no site da Glitterex.

Percebendo que não teriam sucesso em contatar a Glitterex, um outro grupo de jornalistas redirecionou os esforços investigativos sobre a MFI. A sorte foi maior desta vez.

Em uma videorreportagem de 27 minutos vista mais de 2,3 milhões de vezes, o youtuber Jack Joyce e Parjanya Christian Holtz conseguiram entrevistar o ex-CEO da MFI e obter indicações, ainda que indiretas, do tipo de clientes a Glitterex poderia estar mencionando.

A conspiração…que não é tão conspiração assim

Na mesma entrevista, Henry F. Ruschmann confirmou aos jornalistas que, após o fim da Segunda Guerra Mundial, a MFI foi procurada por intermediários do governo norte-americano.

O ex-CEO revelou que sua empresa de glitter teve parte no desenvolvimento de:

  1. Produção de “Chaff”: é um sistema antiradar que tem por base a dispersão de finos pedaços de alumínio, fibra de vidro metalizada ou plástico, com tamanhos distintos; quando jogada no ar, essa mistura interefere na detecção de aeronaves.
  2. Super baterias: colaboração para a produção de baterias elétricas com alta durabilidade, na esteira de um projeto sigiloso das forças armadas dos Estados Unidos.
  3. Passaportes: a MFI produziu o glitter holográfico que compõe os selos de segurança dos passaportes americanos.
  4. Cédulas e cartões de crédito: o mesmo material holográfico impresso nos passaportes estiveram presentes cartões de crédito e em cédulas estrangeiras, conferindo uma forma de validação.

No final, algumas das especulações favoritas da internet mostram ter amparo na realidade. Mas, além da comercialização do glitter propriamente dito, foi a capacidade tecnológica das máquinas de corte de precisão detidas por essas companhias que se tornaram interessantes.

Fonte G1 Brasília

VÍDEOS EM DESTAQUE

ÚLTIMAS NOTÍCIAS