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Jingles genéricos usam melodias de hits e nomes fictícios para atrair candidatos nas eleições

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?Desenrola, bate? vem com o Chiquinho?. ?Ai, ai, ai ai? o Osvaldinho, ele é demais?; ?Acorda, eleitor, que o candidato certo é trabalhador, Ramon é quem eu quero?. Os nomes são fictícios e as melodias são de hits pop transformados em jingles eleitorais, sem autorização dos autores.

Mesmo antes do início oficial da campanha eleitoral de 2022, jingles genéricos são vendidos a candidatos com a melodia de sucessos das paradas atuais. ?Acorda Pedrinho?, ?Tem cabaré essa noite? e ?Pipoco? são as mais usadas (ouça abaixo).

Os jingles com melodias conhecidas são apresentados como ?paródias?, usando um portão judicial aberto em uma briga entre Tirirca e Roberto Carlos.

A disputa começou em 2014, quando o clássico refrão “Eu voltei, agora pra ficar, porque aqui, aqui é o meu lugar” virou “Eu votei, de novo vou votar, Tiririca, Brasília é seu lugar”. Roberto Carlos processou Tiririca pelo uso eleitoral da música ?O portão? sem autorização.

O STJ deu razão a Tiririca, em decisão que considera o uso alterado da música no programa político uma ?paródia?, que pela lei brasileira é isenta de autorização e de pagamento de direitos autorais.

A definição é contestada por associações de compositores (veja mais abaixo) e precisa ser confirmada pelo plenário do STJ, em uma declaração de embargo dos advogados de Roberto Carlos. Mesmo assim, o resultado até agora dá força a uma festa de jingles reciclados.

Versão baratinha

Em agosto de 2022, as amostras já se espalham no YouTube com nomes inventados de políticos. O hit ?Tem cabaré essa noite? vira: ?Nosso deputado estadual, Genival Lacerda, não tem outro igual?. O objetivo é atrair candidatos reais que comprem as gravações com seus nomes para usar na campanha.

Esses jingles reciclados foram um fenômeno nas eleições municipais de 2020, principalmente em campanhas para vereadores, com verbas apertadas. Em 2022, as produtoras miram as campanhas de deputado, já que as de cargos do executivo geralmente têm orçamento maior, para jingles originais.

Um jingle ?paródia? custa a partir de R$ 300, enquanto a composição e gravação de uma música original nas mesmas produtoras pode sair por até R$ 10 mil – valor que fica ainda maior no caso de jingles superproduzidos para candidatos a presidente e governador.

Do carro de som para o TikTok e o Instagram

“Tem cabaré essa noite”, lambada de Nattan e Nivaldo Marques, é a música com versões mais pedidas até agora. “Mas um detalhe é que, se daqui a uma semana estourar outra música, a maioria dos pedidos vai ser ela”, explica Yago Silva, dono de uma produtora em Monteiro (PB).

Ele diz que vendeu 1,2 mil jingles, a maioria “paródias” em que só o nome do candidato mudava, na eleição municipal de 2020. Para isso, a produtora chegava a funcionar 24h por dia, com 20 funcionários temporários, incluindo os músicos. “Teve pedido até um dia antes da eleição”, ele afirma.

Neste ano, até agora, a maioria dos pedidos é de jingles originais, para campanhas maiores. Mas ele ainda recebe pedidos de “paródias” para postulantes a deputado de vários estados.

O estilo despojado dos hits atuais ajuda na na linguagem que precisa ser renovada em 2022, diz Yago. Se antes os jingles iam parar em carros de som, hoje o principal destino são os vídeos curtos do TikTok e dos reels do Instagram.

“O que funcionava muito bem para carro de som era aquela locução bem profissional de radialista, ‘vote em fulano’. Hoje o que funciona é a pessoa vestir a camisa, dizer que vota e, com um botão, criar um vídeo com os jingles que a gente faz”, ele explica.

Versão relâmpago

A demanda e a criação são tão rápidas quanto o sobe e desce das paradas musicais, conta Naiane Baldissera, assistente comercial de uma produtora de jingles em Machadinho (RS).

“Hoje a gente consegue entregar em até dois dias. O cliente preenche um formulário, a gente faz a adaptação da letra, entrega com a base pronta e muda depois o que ele quiser.”

Naiane diz que, até agora, 70% dos pedidos são de jingles originais e 30% são de “paródias” (mesmo percentual citado por Yago).

Todas as produtoras se dizem seguras de que as versões são paródias e, portanto permitidas sem autorização dos autores nem pagamento de direitos autorais.

Rafael Casaes , dono de uma produtora em Feira de Santana (BA), colocou várias versões de hits com nomes genéricos de candidatos no seu site, mas diz que até agora não fechou muitos desses trabalhos.

Ele afirma, no entanto, que não há preocupação quanto aos direitos autorais. “Mesmo sem a decisão do Tiririca, a lei de direitos autorais diz que as paródias são livres”, ele defende.

Músicos contestam

A prática é um “ilegítimo passaporte para alavancar candidaturas e interesses político-partidários, distorcer o processo eleitoral e enganar eleitores, com graves reflexos na democracia brasileira”, dizia o manifesto em fevereiro de 2022.

Apesar da expectativa do julgamento, o ministro Raul Araújo pediu vista do processo, e o embargo ainda está em aberto, sem data definida para ser retomado.

O baiano Manno Góes, autor de sucessos do carnaval de Salvador e diretor de comunicação da União Brasileira de Compositores (UBC), considera a decisão inicial do STJ ?um precedente perigoso, inédito, que não existe em nenhum lugar do mundo?.

“É uma decisão bastante equivocada, e a gente continua pressionando. É inacreditável que um compositor seja obrigado a ouvir sua música sendo aliada a um pensamento político oposto ao seu. Que o bom senso prevaleça, e que seja revertida,”, diz Manno.

“A paródia tem como princípio o humor, a não busca pelo lucro, e quando um candidato usa uma música de um autor sem permissão, está fazendo o uso de uma propriedade intelectual alheia em benefício próprio, não para fazer humor”, ele critica.

O advogado Sydney Sanches, presidente da comissão de direito autoral da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), explica que o direito autoral brasileiro dá espaço à paródia para assegurar liberdade de expressão e o humor no debate público.

“A finalidade da paródia é permitir um ambiente de liberdade de pensamento crítico. Quando você pega esse conceito e amplia para qualquer coisa – como uma candidatura, que no fim das contas é a venda de um produto, na figura do candidato – é um desvirtuamento completo”, diz Sydney Sanches.

Os eleitores menos informados podem achar que os cantores das músicas originais estão, de alguma forma, endossando aquela candidatura. “Em um ano em que falamos tanto de desinformação, notícia falsa, quando você cria a possibilidade dessa mentira isso vira uma grande preocupação”, diz Sydney.

Donos de hits vão procurar direitos

O g1 também procurou autores das músicas mais pedidas até agora para as versões de jingles.

Flavinho Kadet, autor de “Tem cabaré essa noite”, disse que iria procurar a editora da música para saber sobre possíveis providências.

O Dj Chris no Beat, um dos autores de “Pipoco”, com Ana Castela e MC Melody, disse que iria procurar sua distribuidora e tentar tirar os vídeos do ar. “Direitos autorais têm que ser respeitados”, ele afirmou. “Além disso, os jingles estão muito mal feitos”, criticou o músico.

Fonte G1 Brasília

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