O Ministério dos Povos Indígenas disse ao g1 nesta segunda-feira (16) que determinou a revogação da medida da gestão Bolsonaro que liberou a extração de madeira em terras indígenas, inclusive por não indígenas. A pasta tem pressa porque a autorização entra em vigor nesta semana.
Publicada em dezembro do ano passado, no apagar das luzes do governo anterior, a instrução normativa prevê o chamado manejo florestal sustentável em territórios demarcardos, que, em tese, deveriam ser protegidos. A mudança na regra foi duramente criticada por entidades ambientais.
O ministério, que tem como titular Sonia Guajajara, a primeira ministra indígena na história do Brasil, disse ainda que reafirma o seu compromisso com a proteção dos territórios indígenas. A data de publicação da revogação no “Diário Oficial da União” não foi informada.
Entenda a polêmica:
- A medida permite a exploração de madeira em terras indígenas, inclusive por organizações de composição mista, ou seja, entidades com a participação de não indígenas.
- Alvo de invasores e garimpeiros, as terras indígenas estão entre os principais redutos de conservação ambiental no país. Com as novas regras e as lacunas na fiscalização, especialistas temem que a medida facilite a exploração criminosa.
- Além disso, entidades ambientais argumentam que a medida fere a Constituição Federal, que veda a exploração de madeira nesses territórios.
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Em nota ao g1, a Fundação Nacional do Índio (Funai), rebatizada de Fundação Nacional dos Povos Indígenas, afirma que já está em contato com o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) para “determinar providências” a respeito da instrução normativa.
Na nova composição ministerial do governo Lula, a fundação passou a fazer parte da estrutura do inédito Ministério dos Povos Indígenas.
A reportagem também procurou o Ibama, que é vinculado ao Ministério do Meio Ambiente, mas não não havia obtido resposta até a última atualização desta reportagem. Contatada, a pasta também não retornou ainda.
Sob Bolsonaro, que sempre defendeu a exploração de terras indígenas, a Funai, como mostrou o g1, havia justificado que a instrução era uma “reivindicação antiga de diversas etnias” que resultaria “em mais autonomia para os indígenas”, ampliando a “geração de renda nas aldeias de forma sustentável”.
A medida havia sido assinada conjuntamente pelos então presidentes do Ibama, Eduardo Bim, e da Funai, Marcelo Augusto Xavier.
O que diz a medida em 7 pontos:
- Os planos de exploração podem ser apresentados por cooperativas integradas pelos próprios indígenas ou organizações de composição mista (a participação de não indígenas tinha que ser inferior a 50%).
- O grupo interessado em fazer a exploração tem que pedir autorização e, para isso, precisa apresentar um documento técnico avaliando os impactos cultural e econômico nas comunidades que vivem na terra indígena.
- Para embasar o plano, deve ser feito um relatório de viabilidade socioeconômica, que tem que, primeiro, ser submetido à comunidade indígena para consulta. Se aprovado, o relatório tem que ser enviado à Funai, que dá um parecer.
- Também será preciso demonstrar a viabilidade ambiental.
- O plano final depende do aval do Ibama.
- O texto prevê ainda o manejo em três biomas brasileiros: amazônico, caatinga e cerrado.
- A quantidade de madeira a ser extraída deve seguir critérios específicos já existentes para cada um desses biomas (em áreas fora de terras indígenas) e que levam em conta, por exemplo, a necessidade de uso de máquinas para o arraste de toras e o ciclo de corte das árvores.
Críticas: margem para mais destruição
Na época da publicação, a instrução normativa foi duramente criticada por entidades ambientais. De acordo com Juliana de Paula Batista, advogada do Instituto Socioambiental (ISA), o documento abre margem para sérios impactos ambientais e o aumento do desmatamento em terras indígenas.
O que diz a Constituição: De acordo com o artigo 231 da Constituição, “as terras tradicionalmente ocupadas pelos índios destinam-se a sua posse permanente, cabendo-lhes o usufruto exclusivo das riquezas do solo, dos rios e dos lagos nelas existentes“.
O que diz o Estatuto do Índio: Também citado por Batista, o estatuto traz em seu artigo 18 a proibição da “prática da caça, pesca ou coleta de frutos, assim como de atividade agropecuária ou extrativa” em terras indígenas por pessoas não indígenas.
Para a Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib):
- a instrução normativa violava preceitos constitucionais;
- era uma resposta do governo Bolsonaro à demanda dos madeireiros;
- povos que residem nos territórios afetados deveriam ter sido consultados;
“No contexto geral, os ataques aos territórios indígenas, estão diretamente ligados a medidas do poder Executivo, que ao fim do mandato, edita normas que favorecem e incentivam a exploração e a apropriação privada de terras indígenas por parte de não indígenas, dando a invasores confiança para avançarem em suas ações ilegais dentro dos territórios”, afirmou a Apib em nota.
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Ibama e Funai sob novo comando
No último sábado (14), o deputado federal Rodrigo Agostinho foi indicado pela ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, para a presidência do Ibama.
Além de ex-prefeito de Bauru, no interior de São Paulo, Agostinho é biólogo, advogado e ambientalista, membro titular do Conselho Nacional do Meio Ambiente por dez anos.
Já a nova presidente da Funai é Joênia Wapichana, a primeira mulher indígena a assumir o cargo. Primeira indígena eleita na história na Câmara dos Deputados, ela havia sido anunciada pelo presidente Lula como chefe da fundação ainda no final do ano passado.
Fonte G1 Brasília