A pouco mais de 20 dias do fim do ano, o Ministério das Mulheres empenhou ? ou seja, reservou para uso ? apenas 6,2% do orçamento autorizado para apoio à implementação das chamadas Casas da Mulher Brasileira ? espaços de atendimento e acolhimento de mulheres vítimas de violência (leia mais abaixo).
Já do orçamento previsto para o Ligue 180, a Central de Atendimento à Mulher que recebe denúncias de violações contra mulheres, nenhum real foi sequer empenhado. Nos dois casos, ainda não houve qualquer execução dos recursos.
Segundo dados do Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP), o país registrou 722 feminicídios no primeiro semestre deste ano, 2,6% a mais do que no mesmo período do ano passado. No fim de outubro, o presidente Lula sancionou projeto que prevê o pagamento de pensão a órfãos de vítimas de feminicídio.
Na ocasião, a ministra das Mulheres, Cida Gonçalves, disse que “a violência doméstica e familiar contra as mulheres é, sem dúvida, uma das maiores questões sociais que o Brasil enfrenta e seus efeitos seguem, em grande medida, subestimados, invisibilizados nos diferentes setores sociais do Brasil.”
Em nota, o Ministério afirma que herdou “um desmonte nas políticas para as mulheres” e que foi necessário “um esforço de gestão, organização, coordenação e resiliência” para recuperar políticas sociais extintas. A pasta também afirmou que, até o fim do ano, empenhará “de 80 a 85%” do orçamento autorizado.
Casa da Mulher Brasileira
Desde fevereiro, o valor autorizado para despesas discricionárias do Ministério das Mulheres para ações de apoio às Casas da Mulher Brasileira e Centros de Referência da Mulher é de R$ 22,5 milhões. Até agora, no entanto, foi empenhado apenas R$ 1,4 milhão do valor, o equivalente a 6,2% do total autorizado. São recursos destinados à construção e compra de equipamentos, por exemplo.
O Ministério argumenta que a ação é complexa e envolve articulação com outros entes (incluindo órgãos do Judiciário e dos poderes Executivos municipais e estaduais). Segundo a pasta, foi necessário recuperar obras paralisadas ou atrasadas.
“Ocorre que a metodologia adotada no governo anterior retira grande parte do poder de gestão do Ministério, sendo que as obras são conduzidas por estados ou municípios, 100% indicadas por emendas parlamentares, de bancada ou pelo orçamento secreto, que, em determinados locais, não foram previamente informados os diversos entes que irão compor a Casa e nem alinhadas as intenções”, explicou o Ministério.
A pasta afirmou que até o fim do ano serão empenhados R$ 15 milhões para construções de unidades em Corumbá (MS) e Marabá (PA), e que outros R$ 2 milhões serão destinados para veículos que atendam as demandas de unidades já em funcionamento.
Outra estrutura coberta pelos mesmos recursos são os Centros de Referência da Mulher. Neste caso, o Ministério disse que foram concluídos editais para compra de móveis e equipamento, incluindo dispositivos móveis de monitoramento para uso no âmbito da Lei Maria da Penha. A pasta também previu a liberação de R$ 3 milhões para ações de educação para prevenção às violência contra as mulheres.
Ligue 180
Entre janeiro e outubro deste ano, o Ligue 180 ? o principal canal de denúncias de violência contra mulheres ? registrou mais de 74 mil denúncias, o equivalente a um atendimento telefônico por minuto. O Ministério das Mulheres anunciou recentemente a ampliação do atendimento, inclusive com a criação de um canal no WhatsApp, para recebimento das denúncias.
Mesmo assim, o programa orçamentário que prevê recursos para aperfeiçoamento do canal não gastou nem reservou nenhum valor dos R$ 3,3 milhões autorizados no orçamento para este ano. Segundo o Ministério, seria apenas um “saldo de contrato”, já que a execução orçamentária do Ligue 180 é realizada no âmbito do Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania via contrato firmado na gestão anterior.
Em nota, a pasta alegou que se trata “de mais um caso de sucateamento das políticas para as mulheres”. O Ministério afirmou que a integração do Ligue 180 ao Disque 100 ? o canal mantido pelo Ministério dos Direitos Humanos para denúncias de violações de direitos humanos ? prejudicou os serviços e que houve uma desintegração da base de dados na gestão anterior.
Segundo o Ministério das Mulheres, houve um processo de reestruturação da central de denúncias no primeiro semestre e uma nova licitação para o contrato do canal está em preparação. A pasta afirmou ainda que está firmando uma parceria com a Universidade de Brasília (UnB) para análise do programa e produção de uma nova metodologia de atendimento a ser empregada em 2024. O trabalho receberá R$ 1,3 milhão ? ainda em 2023, segundo o governo.
Emendas parlamentares
A demora no empenho dos recursos afeta de maneiras distintas os recursos a cargo exclusivamente do Ministério e o dinheiro destinado por emendas parlamentares.
No Ministério das Mulheres, o programa “Proteção à Vida, Fortalecimento da Família, Promoção e Defesa dos Direitos Humanos para Todos” tem autorizados este ano R$ 138 milhões. Mais da metade deste valor, R$ 70,3 milhões, estão alocados nas despesas discricionárias (não obrigatórias) da pasta. Deste total, apenas R$ 6,77 milhões (9,63%) foram empenhados até agora.
Ao mesmo tempo, as emendas individuais parlamentares ? que são impositivas, ou seja, que devem ser efetivamente utilizadas até o fim do ano ? somam R$ 59,18 milhões, dos quais R$ 41,6 milhões (70%) já foram empenhados.
O Ministério não explicou a disparidade entre os empenhos.
Fonte G1 Brasília