Quando um Procurador de Justiça ergue a voz contra o silêncio institucional, é prudente escutar. Foi o que fez Domingos Sávio, membro do Ministério Público de Mato Grosso (MPMT), ao lançar um alerta que, embora articulado com rigor técnico, possui a contundência de um libelo contra a omissão institucional. Ao denunciar o avanço do chamado “crime organizado dos engravatados”, Sávio fez mais do que descrever um fenômeno: expôs, com elegância e coragem, a apatia de seu próprio órgão diante de escândalos que pairam sobre o governo Mauro Mendes.
Sem citar nomes, mas com contornos que dispensam legenda, o procurador descreveu estruturas criminosas compostas por personagens bem-apessoados, de fala mansa e endereço nobre, mas que agem para dilapidar os cofres públicos, fraudar licitações e executar obras de qualidade duvidosa em troca de vultosos contratos. “Essas organizações também merecem o nosso repúdio, a nossa indignação e devem ser combatidas com muito rigor”, afirmou, citando a Lei nº 12.850/2013, que define organização criminosa.
Não tardou para que a pergunta ganhasse corpo nos bastidores: estaria Domingos Sávio direcionando suas palavras à atual gestão do MPMT – ou talvez às duas anteriores – que têm ignorado, de forma reiterada, pedidos de investigação sobre contratos, concessões e outras práticas suspeitas do governo estadual? Seria, nas entrelinhas, um chamado de consciência ao atual Procurador-Geral de Justiça?
A crítica é sutil, mas aguda. E se soma à crescente insatisfação de segmentos da sociedade civil, da imprensa e até de membros da própria estrutura ministerial, diante da aparente seletividade do MPMT: célere e implacável contra facções armadas, mas, por vezes, omisso frente a organizações criminosas que usam caneta e decreto como armas.
Ao destacar a leniência do sistema penal com crimes como corrupção, peculato e concussão – cujas penas seguem risíveis –, Domingos Sávio evoca um paradoxo doloroso: o crime de gravata é menos temido, mas talvez mais destrutivo.
Sua fala, portanto, não pode ser lida apenas como reflexão jurídica. É, sobretudo, um chamado ético: um alerta ao Ministério Público, que precisa se reconectar com sua missão constitucional de zelar pelo interesse público – e não por conveniências de ocasião.