O Brasil é um dos maiores exportadores mundiais de soja, milho e minério de ferro. Mas, apesar da riqueza que sai dos portos nacionais, quem fatura oficialmente com essas vendas são paraísos fiscais como as Ilhas Turcas e Caicos. Essa triangulação comercial, operada por grandes empresas com sede no Brasil, tem levantado sérias suspeitas de crimes como sonegação fiscal, evasão de divisas e lavagem de dinheiro.
A engrenagem funciona com a criação de subsidiárias das empresas brasileiras nesses paraísos fiscais. A exportação é registrada como venda para essas subsidiárias por um valor artificialmente reduzido. A mercadoria, no entanto, segue diretamente ao destino final — como China ou países árabes — enquanto a subsidiária, que nada produz, refatura a carga com o preço real de mercado, embolsando o lucro no exterior. No papel, o Brasil vende barato. Na prática, exporta riqueza sem contrapartida tributária.
A denúncia foi feita de forma didática pela economista e auditora-fiscal aposentada da Receita Federal Maria Lúcia Fattorelli, em entrevista recente. Fattorelli, que coordena a organização Auditoria Cidadã da Dívida, é referência internacional em temas como transparência fiscal, soberania econômica e combate à financeirização do Estado. Segundo ela, a manobra é uma fraude disfarçada de legalidade: “A mercadoria vai para a China, mas quem vende no papel é uma empresa nas Ilhas Turcas. Isso para mim é fraude. Eles dizem que pode fazer. Mas só porque está permitido, não deixa de ser um golpe contra o país”, alertou.
Juristas e economistas reforçam que a operação pode violar normas de preço de transferência e ser enquadrada nas leis que tratam de crimes contra a ordem tributária (Lei 8.137/90), evasão de divisas (Lei 7.492/86) e lavagem de dinheiro (Lei 9.613/98) — especialmente quando os lucros são ocultados e posteriormente legalizados em fundos ou investimentos simulados.
Enquanto o Brasil arca com os custos sociais e ambientais da produção de commodities, os lucros evaporam por artifícios financeiros que concentram riqueza fora do alcance do Estado. O alerta foi dado. Resta saber se o Congresso e os órgãos de controle fiscal terão coragem — e independência — para agir.