O Ministério da Saúde instalou nesta quarta-feira (1°), em Brasília, uma “sala de situação” para monitorar os casos crescentes de intoxicação por metanol após consumo de bebida alcoólica e coordenar as medidas a serem adotadas.
Segundo o ministro Alexandre Padilha, o objetivo do espaço é unificar as informações sobre os casos de intoxicação pelo país e planejar, organizar, coordenar e controlar as ações neste momento de alerta das autoridades em Saúde Pública de todo o país, devido aos casos de intoxicação suspeitos e confirmados.
?Nós estamos diante de uma situação anormal e diferente de tudo o que consta na nossa série histórica em relação à intoxicação por metanol no país?, disse Padilha.
O Ministério da Saúde afirma que a equipe técnica da sala de situação será composta por representantes dos ministérios da Saúde, Justiça e Segurança Pública, Agricultura e Pecuária, pelos conselhos Nacional de Saúde (CNS), Nacional de Secretários de Saúde (CONASS) e Nacional de Secretarias Municipais de Saúde (CONASEMS), Anvisa e as secretarias de Saúde de São Paulo e Pernambuco.
?A Sala de Situação tem caráter extraordinário e vai permanecer ativa enquanto persistirem o risco sanitário e a necessidade de monitoramento e resposta nacional à intoxicação por metanol após o consumo de bebida alcoólica?, afirma a pasta.
O Brasil registrou 43 notificações de intoxicação por metanol, até esta quarta-feira (1º), de acordo com o Centro Nacional de Informações Estratégicas em Vigilância em Saúde (CIEVS Nacional).
Desses, 39 são em São Paulo ? sendo 10 casos confirmados de intoxicação por metanol em bebida e 29 em investigação ? e 4 em investigação em Pernambuco. Foi registrada uma morte em São Paulo, enquanto outras sete seguem em investigação, cinco em São Paulo e dois em Pernambuco.
“O Ministério da Saúde enviou, nesta terça-feira (30), uma nota técnica a todos os estados e municípios, orientando que qualquer suspeita de intoxicação por metanol seja notificada imediatamente. O documento também traz diretrizes para que os serviços de saúde adotem a condução adequada dos casos e garantam a comunicação rápida das ocorrências.”
Veja os números do balanço mais recente do governo de SP:
Casos:
- há 10 casos confirmados de intoxicação por metanol (há laudo atestando presença de metanol e confirmação de circunstâncias que indicam que a pessoa ingeriu bebida adulterada)
- outros 29 casos estão sob investigação (há indícios clínicos, mas aguardam laudo para confirmar presença de metanol e investigações para entender circunstâncias de eventual ingestão da substância)
Mortes:
- Uma morte confirmada por intoxicação por metanol após consumo de bebida adulterada (com laudo e confirmação de ingestão de bebida adulterada)
- Cinco mortes sob investigação (sem laudo e sob investigação das circunstâncias)
A intoxicação por metanol a partir do consumo de bebidas alcoólicas batizadas ? como gin, vodca e whisky ? já provocou casos de internação grave, perda de visão e até mortes no estado de São Paulo nas últimas semanas.
? O metanol é um álcool usado industrialmente em solventes e outros produtos químicos, é altamente perigoso quando ingerido. Inicialmente, ataca o fígado, que o transforma em substâncias tóxicas que comprometem a medula, o cérebro e o nervo óptico, podendo causar cegueira, coma e até morte. Também pode provocar insuficiência pulmonar e renal.
Até o momento, seis mortes em São Paulo estão relacionadas à intoxicação. Uma delas já foi comprovadamente causada pelo consumo de bebida adulterada, enquanto outras cinco seguem em apuração.
As autoridades não divulgaram oficialmente a identidade das vítimas, mas a TV Globo e o g1 conseguiram localizar alguns dos pacientes. A seguir, conheça as histórias de pessoas que tiveram a vida profundamente afetada após o consumo de bebidas adulteradas.
Adega na Zona Sul
No dia 30 de agosto, Rafael Anjos Martins, de 28 anos, comprou duas garrafas de gin, além de gelo de coco e energético, em uma adega localizada na região da Cidade Dutra, na Zona Sul da capital.
Em seguida, ele se reuniu com quatro amigos em casa para confraternizar. Nenhum deles desconfiou da adulteração.
Poucas horas depois do consumo, Rafael começou a passar mal e foi levado às pressas para o hospital. Os médicos realizaram procedimentos para remover a toxina do sangue, mas o metanol já havia atingido o cérebro e o nervo óptico.
Os amigos, que ingeriram a bebida adulterada em menor quantidade, também sofreram consequências. Nathalia Carozzi Gama contou à TV Globo que a visão foi afetada.
“As coisas estavam com muito contraste e muita falta de ar, com mal-estar, um peso no corpo. Eu fui para o hospital, fizeram o exame e viram que estava com metanol?, relatou.
Bar nos Jardins
A designer de interiores Radharani Domingos, de 43 anos, perdeu a visão após consumir três caipirinhas feitas com vodca em no bar Ministrão na Alameda Lorena, bairro nobre de São Paulo. O local foi interditado.
?Era uma região nobre, não era nenhum boteco de esquina. Causou um estrago bem grande. Não estou enxergando nada?, disse Radharani ao Fantásrico. No local, a polícia apreendeu cerca de 100 garrafas de bebidas destiladas suspeitas de adulteração.
Segundo a irmã dela, Lalita Domingos, ainda não há previsão de alta. “O oftalmologista entrou com tratamentos para reverter o quadro da visão, mas ela [visão] permanece comprometida. Estamos na expectativa de que algo mude.”
Show de pagode
No domingo (28), Bruna Araújo de Souza, de 30 anos, saiu para assistir a um show de pagode com amigos em um bar de São Bernardo do Campo, na Grande São Paulo. Durante a tarde e a noite, ela consumiu algumas doses de bebida, incluindo um ?combo? de vodca com suco de pêssego.
Na manhã seguinte, Bruna começou a sentir sintomas como dor intensa no corpo, falta de ar e visão embaçada. Foi levada a uma UPA da cidade, mas seu quadro se agravou rapidamente e ela precisou ser transferida entubada para o Hospital de Clínicas de São Bernardo, onde permanece em estado grave.
Familiares relatam que o namorado dela também apresentou sintomas e foi internado em outra unidade de saúde. ?Ela estava feliz, se divertindo, e agora a gente não sabe como vai ser daqui para frente?, contou um parente.
Whisky em festa
O caso de Wesley Pereira, de 31 anos, começou em agosto, quando ele participou de uma festa na Zona Sul da capital paulista. Em determinado momento da comemoração, Wesley consumiu whisky que havia sido levado ao local. Poucas horas depois, passou mal e entrou em coma.
Desde então, ele permanece internado no Hospital do Campo Limpo. Segundo a família, Wesley sofreu uma série de complicações: teve pneumonia por broncoaspiração, um dos rins parou de funcionar e, quando os médicos reduziram a sedação para tentar acordá-lo, ele sofreu um AVC.
?Ele perdeu a visão e a vida dele nunca mais vai ser a mesma?, contou a irmã, Sheilene Pereira Neves. Wesley continua em tratamento intensivo e luta para se recuperar.
Vodca adulterada
O advogado e empresário Marcelo Lombardi, de 45 anos, dono de uma imobiliária familiar na região do Sacomã, Zona Sul de São Paulo, morreu após consumir uma garrafa de vodca adulterada. Segundo a família, ele comprou a bebida em uma adega para beber em casa, sem suspeitar de irregularidades.
Na manhã seguinte, Marcelo acordou desorientado, já sem visão, e foi levado ao hospital. O quadro evoluiu para uma parada cardiorrespiratória e falência múltipla dos órgãos. No atestado de óbito, os médicos apontaram o metanol como causa da intoxicação.
Marcelo era casado e morava com a esposa e uma cachorrinha. A irmã relatou ao g1 que ele era o pilar da família. ?Perdemos a nossa base?, desabafou.
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Fonte G1 Brasília