Enquanto hospitais do interior de Mato Grosso fecham por falta de médicos e escolas operam em condições precárias, o governo estadual planeja mais um delírio de concreto: a construção de um autódromo internacional padrão FIA no Parque Novo Mato Grosso, ao custo estimado de R$ 3 bilhões. O local já é conhecido como o “Parque dos Bilionários” — um reduto murado, feito com dinheiro público, mas reservado para poucos. Agora, além de gramados importados e lagos ornamentais, o espaço vai ganhar uma pista de Fórmula 1 para alimentar a vaidade de alguns e o custo de muitos.
É inevitável o comparativo com a Arena Pantanal — construída para a Copa do Mundo de 2014, ao custo de mais de R$ 600 milhões. Hoje, o estádio está deteriorando, largado, com infiltrações, cadeiras quebradas e estrutura comprometida. E olha que ali se joga futebol, o esporte mais popular do Brasil, acessível, democrático, com times locais que arrastam multidões, mesmo sem apoio decente. Se o Estado não cuida de uma arena para o povo, por que cuidaria de um autódromo para poucos?
Cuiabá tem 700 mil habitantes. O estado inteiro, pouco mais de 3,5 milhões. São Paulo, com 11 milhões, mal consegue viabilizar o lendário Interlagos, que passa metade do ano parado. Brasília, terra de campeões como Nelson Piquet e Roberto Pupo Moreno, não salvou seu autódromo do abandono. Por que, então, insistir nesse devaneio em pleno Cerrado? Por que gastar bilhões para que uma elite brinque de correr, enquanto o cidadão comum espera atendimento nos corredores do SUS?
Esse projeto é mais que um erro: é um desprezo escancarado pela realidade social de Mato Grosso. O autódromo no Parque dos Bilionários será o novo símbolo da desigualdade, uma nova Casa Grande erguida com o suor da senzala moderna, que paga impostos, mas não vê retorno. Quando ouvirem o ronco dos motores, lembrem-se: essa corrida é para poucos — e a conta é para todos.