O Cuiabá (MT) — A vereadora Michele Alencar resolveu surpreender os cuiabanos nesta semana — e não foi com um projeto para melhorar a cidade, mas com um vídeo nas redes sociais em que aparece animada, cruzando a BR em direção a Nossa Senhora do Livramento, onde foi dar uma palestra sobre o Maio Laranja, campanha de enfrentamento à exploração sexual infantil. A boa causa é inquestionável. Mas o gesto, vindo de uma vereadora eleita para representar Cuiabá, levantou sobrancelhas e questionamentos.
Enquanto na atual gestão do prefeito Abílio Brunini as escolas da capital enfrentam falta de estrutura, postos de saúde funcionam sem água e bairros sofrem com violência, a parlamentar preferiu usar parte do seu tempo — e da visibilidade do cargo — para aparecer em outro município, com discurso pronto, microfone na mão e olhares para além do mapa eleitoral. Afinal, quem paga o salário da vereadora é o povo cuiabano, mas quem recebeu a palestra foram crianças de outra cidade. Está certo isso?
Não se trata de egoísmo geográfico, mas de responsabilidade com o cargo que ocupa. A função de um vereador é fiscalizar, propor e representar o município que o elegeu. Trocar a rota da Câmara por palanques em outros lugares, ainda mais em dias úteis, soa menos como serviço público e mais como campanha disfarçada. E olha que nem começou a eleição.
A história política de Michele também não ajuda a dissipar dúvidas. Surgiu distribuindo cestas em lixões, impulsionada pela ex-madrinha política Virgínia Mendes — que depois a tirou do palanque, mas deixou o marido da vereadora bem encaixado num cargo de governo. Com isso, a parlamentar foi se mantendo na cena, cultivando a imagem de “boneca de porcelana”, mas com planos bem mais ambiciosos que um mandato na Câmara Municipal.
Agora, com discurso pronto e vontade de ser deputada estadual, a vereadora parece usar Cuiabá como trampolim, e não como prioridade. O problema é que, enquanto ela sobe nos likes, quem segue esperando resultado é o povo que votou nela.
Se a vontade é mesmo trabalhar por todo o estado, o caminho é legítimo: renuncie, se lance a outro cargo, mas não use o mandato cuiabano pra fazer carreira fora da cidade. Porque palanque tem limite, e a paciência do eleitor, também.