Marco Polo Pinheiro é Gestor Público e jornalista
Por anos, Mato Grosso ostentou títulos que vão do celeiro do agronegócio brasileiro à potência econômica nacional. Porém, há uma linha tênue entre progresso e exclusão, e essa linha foi ultrapassada de forma gritante com o projeto do Parque Novo Mato Grosso. O que se apresenta como uma obra de “desenvolvimento” é, na realidade, a oficialização de um apartheid social, uma afronta ao povo cuiabano e mato-grossense.
A construção do parque, em área de barões bilionários da soja, escancara um descompasso moral e ético no governo de Mauro Mendes. Não se trata de criar um espaço público para todos, mas de levantar muros — visíveis e invisíveis — que separam a Cuiabá dos ricos da Cuiabá dos pobres. O parque, que começou com orçamento de R$ 100 milhões, já escalou para mais de R$ 600 milhões e pode ultrapassar os R$ 2 bilhões. Dinheiro público, suado, financiando um projeto que beneficia a elite econômica do estado.
Um parque para quem?
Autódromos, rodas-gigantes milionárias, estruturas faraônicas. O discurso de que a obra “fortalece o agronegócio” não convence, mas revolta. O agronegócio já é amplamente beneficiado por isenções fiscais generosas. Por que não financiar o parque com recursos próprios, em vez de usar o dinheiro do povo? A resposta é simples: essa obra não é para o povo. É um projeto para poucos, um condomínio disfarçado de parque, onde a exclusividade será o verdadeiro atrativo.
Ainda mais estarrecedor é o fato de que a área em questão está sendo disputada judicialmente por um idoso, o antigo proprietário, que luta contra os gigantes da soja. Mas, a justiça não é cega.
O muro invisível
Mauro Mendes já deixou claro seu desprezo pelo povo cuiabano em outros episódios: ao trocar o VLT pelos ônibus, ignorando anos de investimentos e as necessidades de mobilidade urbana; ao proibir os ribeirinhos de pescar no Rio Cuiabá, violando tradições e meios de subsistência locais. Agora, ele ergue o muro definitivo. Não é de concreto, mas de exclusão, separando a Cuiabá dos bilionários da Cuiabá do povo.
O paralelo com o apartheid sul-africano não é exagerado. O Soweto de Mato Grosso está sendo desenhado com cada decisão que prioriza uma elite em detrimento da maioria. Quem paga a conta é o povo, que vê seus recursos serem usados para fortalecer quem já é forte e para humilhar quem já enfrenta as maiores dificuldades.
A vergonha como política de estado
A maior vergonha não é apenas o parque em si, mas o que ele simboliza: um governo que governa para poucos, que transforma o público em privado, que despreza o povo cuiabano e ignora suas reais necessidades. A vergonha é sermos governados por quem não ama a terra onde vive, mas apenas explora seus recursos em nome do lucro.
Cuiabá e Mato Grosso precisam despertar. Precisamos lutar contra o avanço dessa mentalidade que separa e exclui, que levanta muros e ergue palácios enquanto destrói comunidades. Rezar, sim, mas também agir. Não podemos permitir que o século XXI nos devolva às práticas mais vergonhosas do passado. Que o povo cuiabano, unido, derrube os muros da vergonha e reconquiste a dignidade que lhe está sendo roubada.
Marco Polo Pinheiro é Gestor Público e jornalista