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Pesquisador contesta e pede retificação do nome de igreja no Coxipó do Ouro

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Mariana da Silva – Especial para o GD

Existe um consenso em Cuiabá de que a primeira igreja construída na Capital e também local onde teria sido realizada a primeira missa foi na então denominada Igreja de Nossa Senhora da Penha de França, no Distrito do Coxipó do Ouro, a cerca de 25 km da capital.

No entanto, o pesquisador, memorialista e conselheiro estadual de cultura, Francisco das Chagas Rocha, contesta esta informação e diverge do próprio nome indicado à igreja em seu tombamento, publicado no Diário Oficial, que data de 19 de julho de 2010.

Francisco alega que faltou aprofundamento na documentação histórica e que seria necessário um dossiê documental que pudesse sustentar essa afirmação de que o nome da igreja seria Nossa Senhora da Penha de França. Com base em registro encontrado na Cúria metropolitana de Cuiabá, ele reuniu indícios de que o nome da igreja, na verdade, é Nossa Senhora do Rosário, e que ela não teria sido construída por volta do ano 1700, como dizem algumas fontes.

Igreja no distrito do Coxipó do Ouro por volta de 1950. Acervo fotográfico de Francisco das Chagas Rocha.

Conforme o estudioso, o registro da construção da igreja data de 13 de dezembro de 1825, ou seja, fará 200 anos em 2025. Além disso, até mesmo os moradores da localidade com quem conversou e que residem nas proximidades da igreja há gerações contam que desde o nome do local até as celebrações realizadas sempre remetem a Nossa Senhora do Rosário.

Na ocasião Cuiabá era administrada pelo Frei Jose Maria de Macerata, frade franciscano indicado por Dom Pedro I para ser o primeiro Bispo de Cuiabá. Por ser estrangeiro, a Câmara não aceitou e ele ficou como administrador apostólico por 7 anos até a nomeação de Dom José Antônio dos Reis.

Cópia do documento presente na cúria metropolitana.

Acervo fotográfico de Francisco das Chagas Rocha.

Confira na íntegra a transcrição do documento:

“Registro da Portaria de faculdade concedida a João Pires de Camargo para fazer celebrar a Santa Missa na Capella de Nossa Senhora do Rosário por tempo de três anos como abaixo se declarou. Sendo em consideração as Súpplicas de João Pires de Camargo, relativamente à aprovação da Capella dedicada a Nossa Senhora do Rosário, que de licença de nosso antecessor erigira nas margens do Rio Coxipó Mirim, e querendo consequentemente favorece-lo visto a informação favorável, que deu o nosso provisor e Vigário Geral Interino e o bem que resulta aos Povos ali moradores, Havemos por bem e Nos apraz pelo teor dos presentes de aprovar a erecção da dita Capella e conceder licença ao suplicante para que ainda nas festas privilegiadas possa fazer e celebrar o Santo Sacrifício das Missas na dita Capella por qualquer sacerdote aprovado que lhe parecer, o qual nos Domingos e dias Santos terá a abnegação de rezar com o Povo os Atos de Fé, de Esperança, de Caridade e Contrição, e de instrui-los nos Dogmas da Nossa Santa Religião. Esta graça durará pelo tempo de três anos contados da data desta, e o suplicante dará para a fábrica da paróchia huma esmola, segundo sua possibilidade. Palácio Episcopal de Cuyabá em 13 de dezembro de 1825. = Com a assinatura episcopal = Frei Marcelino das Chagas de Goyáz – Secretário E nada mais se continha. Está conforme Fernandes.”

Francisco, que trabalha com genealogia e história de Cuiabá, também é fundador da página Cuiabá de Antigamente, que conta com 194 mil membros no Facebook e 3.527 seguidores no Instagram.

“Recebo algumas indagações e vou pesquisando. Tenho todos os documentos digitalizados, que a diocese de Cuiabá mandou digitalizar e vendia em CDs. Então, eu tenho CDs digitalizados e os CDs da cúria, neles estão todos os documentos desde a fundação de Cuiabá. […] Percorrendo um por um desses documentos, eu encontrei este que trata da construção da igreja”, conta sobre o achado. 

Quem também confirma a informação é Francisca Amorim, nascida no Coxipó do Ouro, filha da professora Mirtes Amorim, uma matriarca de família tradicional do Coxipó do Ouro. Ela afirma que a igreja sempre foi de Nossa Senhora do Rosário, inclusive ela e membros de sua família participaram por décadas da organização da Festa do Divino Espírito Santo na localidade.

Segundo ela, a placa que estaria no local indicando Nossa Senhora da Penha de França, na verdade, pertenceria a outra igreja situada na estrada da Ponte de Ferro. “Não tem nada a ver aquela placa com a gente, é uma placa de outra comunidade”, disse. Conforme Francisca, a placa teria sido colocada de forma errônea em 2016 pela gestão da Secretaria de Cultura.

História do local

No pedido de tombamento da portaria, além da Igreja, considerava-se também o Arraial dos Freitas, no Coxipó do Ouro, devido a sua importância histórica e por considerar o local como “referência do antigo Arraial da Forquilha dos idos de 1700, onde foi achada uma lavra aurífera no córrego do queimado, localizado próximo ao córrego do Mutuca, onde devido à abundância do achado ali se instalou numa pequena aglomeração populacional”.

Dentre as justificativas está também a importância histórica do local, pois sua fundação está ligada a constituição do estado de Mato Grosso como província separada de São Paulo, e ao ciclo do ouro e relevância ainda demarcação de novas fronteiras do país.

Imagem de Nossa Senhora do Rosário na Igreja do Coxipó do Ouro. Acervo fotográfico de Francisco das Chagas Rocha

Francisco explica que Pascoal Moreira Cabral, quando chegou a Cuiabá, em 1719, juntamente dos bandeirantes, fundaram o Arraial da Forquilha na região do Rio dos Peixes com Ribeirão do Mutuca.

O local leva este nome devido ao entroncamento dos rios que tinha formato semelhante ao de uma forquilha e lá permaneceram até 1722. “Quando ele soube que Miguel Sutil encontrou o ouro em Cuiabá, ali na prainha, eles abandonaram o Arraial da Forquilha”, afirma.

O nome de Nossa Senhora da Penha de França pode ter vindo do fato de que a santa é padroeira dos navegantes, que quando faziam incursões para desbravar ou fundar essas vilas, traziam essas imagens, o que explicaria o nome anteriormente. No entanto, as documentações encontradas divergem desta informação, que segundo Francisco carece de embasamento para comprovar que seria Nossa Senhora da Penha de França.

Outro forte documento que corrobora a tese é que na certidão de batismo do ex-presidente da república Eurico Gaspar Dutra, registrado no local, consta o nome de Igreja Nossa Senhora do Rosário.

Certidão de batismo de Eurico Gaspar Dutra. Acervo fotográfico de Francisco das Chagas Rocha

Francisco também acredita que no local não poderia ter sido realizada a primeira missa, por uma questão de logística. Assim como para outros historiadores, para ele, o local seria muito distante de onde os primeiros bandeirantes chegaram antes do Arraial da Forquilha. “Mas como foi celebrada [a primeira missa] no Coxipó do Ouro se os bandeirantes chegaram lá no São Gonçalo Velho onde está o Flor Ribeirinha? […] Então isso aí também é um ponto divergente”, afirma.

Com base na documentação histórica, Francisco pretende encaminhar seu estudo para uma retificação de nome, que inclusive já teve a nomenclatura alterada na placa que se encontra no local. Após dar entrada na documentação ela passará pelo Conselho Estadual de Cultura onde será verificado se existe fundamento, entrará em pauta com os documentos inseridos e só então o processo será desarquivado e analisado.

“Fica mais que claro que houve um erro no teor do pedido de tombamento e eu como conselheiro do Estado pretendo pedir junto ao Conselho Estadual de Cultura que seja revisto, porque lá está tombado como Nossa Senhora da Penha de França, quando, na verdade, é igreja Nossa Senhora do Rosário”, afirma.

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