O Movimento Desonera Brasil pediu nesta sexta-feira (29) ao presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), a devolução, ao governo, da medida provisória editada para reonerar, de forma gradual, a folha de pagamento de 17 setores da economia.
A entidade reúne representantes dos 17 setores que empregam mais de 9 milhões de pessoas. Esses segmentos são afetados pela MP elaborada pelo Ministério da Fazenda ? e publicada no “Diário Oficial da União” nesta sexta. Com a medida, o governo busca elevar a arrecadação para tentar zerar o déficit fiscal nas contas públicas (saiba mais aqui).
No ofício enviado a Rodrigo Pacheco, o Movimento Desonera Brasil afirma que a edição da medida provisória gera “grave insegurança” e “elevado risco” para empregos (leia a íntegra aqui).
“Diante do elevado aumento de carga tributária sobre o emprego de todos os setores contemplados, é provável que as empresas sejam forçadas a fazer ajustes em seus quadros e em seus investimentos, o que poderá provocar demissões em massa no primeiro trimestre de 2023”, afirma a entidade no documento.
Os setores também destacam que a desoneração da folha de pagamentos é uma política pública “com amplo apoio no Congresso Nacional“. E lembram que o Legislativo aprovou a prorrogação da desoneração até dezembro de 2027, promulgada nesta quinta-feira (28) após derrubada de veto do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT).
“Na prática a Medida Provisória está sendo usada como uma forma de segundo veto não previsto na Constituição Federal. O Poder Executivo estaria ‘derrubando a derrubada do veto'”, dizem os segmentos.
Quando uma MP é devolvida à presidência da República, os efeitos das regras previstas nela perdem a validade.
Em junho de 2021, por exemplo, Rodrigo Pacheco devolveu uma MP, que havia sido editada por Jair Bolsonaro (PL) em 2021, para limitar a remoção de conteúdos publicados nas redes sociais.
Nota técnica
Junto com o ofício, o Movimento Desonera Brasil enviou a Rodrigo Pacheco uma nota técnica para embasar o pedido de devolução da MP ao governo.
O parecer jurídico é assinado pelo professor de Direito Tributário da Universidade de São Paulo (USP) André Mendes Moreira.
Ele afirma que a edição da medida provisória editada pelo governo se sobrepõe à “soberania” do Congresso Nacional.
Mendes Moreira avalia ainda que o texto não atende a outros requisitos constitucionais necessários para a edição de uma MP, como a urgência constitucional, e também “eleva a injustiça tributária e a regressividade da tributação”.
Segundo ele, a medida provisória “desconsidera o processo legislativo” que levou à derrubada do veto do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e a retomada da prorrogação da desoneração por mais quatro anos. Para o professor, a MP viola princípio da separação de Poderes.
“Uma decorrência da separação dos Poderes é a impossibilidade de se reenviar medida provisória para tratar de assunto já analisado no mesmo ano pelo Congresso Nacional. Outra é a vedação de envio de projeto de lei para tratar de matéria já apreciada em outro projeto de lei no mesmo ano, salvo se a proposta advier da maioria absoluta dos membros da Câmara ou do Senado”, argumenta.
“A racionalidade [por] trás das regras é singela: a soberania do Poder Legislativo não pode ser desrespeitada com a ‘insistência’ em tema que já tenha sido objeto de deliberação na mesma sessão legislativa”, completa o especialista.
A prorrogação da desoneração
Neste ano, o Congresso Nacional aprovou a prorrogação da desoneração da folha de pagamentos por mais quatro anos ? até 31 de dezembro de 2027. A medida foi vetada pelo presidente Lula, mas, em sessão conjunta e por ampla maioria, o Legislativo derrubou o veto presidencial.
Com isso, a prorrogação foi promulgada pelo Congresso. Isso possibilita que empresas dos 17 setores intensivos em mão de obra substituam a contribuição previdenciária ? de 20% sobre os salários dos empregados ? por uma alíquota sobre a receita bruta do empreendimento, que varia de 1% a 4,5%, de acordo com o setor e serviço prestado.
O que diz a MP editada pelo governo
A MP reúne um pacote do ministro da Fazenda, Fernando Haddad, para tentar zerar o déficit das contas públicas federais nos próximos anos.
Entre as medidas, está o retorno gradual da cobrança de impostos sobre a folha de pagamentos dos 17 setores, que empregam mais de 9 milhões de pessoas. A reoneração gradual entraria em vigor a partir 1º de abril de 2024.
Com a medida provisória editada, o imposto voltará a incidir sobre a folha de pagamentos, mas com uma “desoneração parcial” na folha de cada trabalhador. O desconto incidirá apenas sobre um salário mínimo por trabalhador ? a remuneração que ultrapassar essa faixa sofre a tributação normal.
A medida provisória muda a lógica da desoneração ? em vez dos 17 setores, o texto cria dois grupos de “atividades econômicas” com tributação diferenciada.
Para o primeiro grupo, que inclui atividades de transporte, comunicação e tecnologia da informação, a tributação será de:
- 10% em 2024
- 12,5% em 2025
- 15% em 2026
- 17,5% em 2027
Para o segundo grupo, que inclui atividades da indústria têxtil, da engenharia civil e do mercado editorial, a tributação será de:
- 15% em 2024
- 16,25% em 2025
- 17,5% em 2026
- 18,75% em 2027
Reações
Além do Movimento Desonera Brasil, a Frente Parlamentar do Empreendedorismo também pediu a Pacheco a devolução da MP enviada pelo governo ao Congresso.
No documento, o presidente da FPE, deputado Joaquim Passarinho (PL-PA), diz que a MP editada pelo governo “é uma afronta ao Poder Legislativo”.
?Essa medida provisória da desoneração da folha editada pelo governo, é uma afronta ao poder Legislativo. Essa matéria foi votada este ano por duas vezes na Casa. Houve o veto. O veto foi derrubado nas duas Casas por ampla maioria, mostrando a vontade legislativa que representa a população desse país?, declarou.
A frente parlamentar também diz que a devolução de uma medida provisória sobre o tema já ocorreu em 2015. Na ocasião, o então presidente do Senado, Renan Calheiros (MDB-AL), remeteu de volta ao Planalto uma MP, editada pela presidente Dilma Rousseff (PT), para reduzir a desoneração da folha de pagamentos.
Íntegra do ofício dos setores
Leia a íntegra do ofício enviado pelo Movimento Desonera Brasil para o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco:
Senhor Presidente,
As entidades signatárias, representantes dos setores de mão de obra intensiva contemplados pela Contribuição Previdenciária sobre a Receita Bruta (CPRB), vêm, por intermédio deste expediente, pleitear a V. Exa. a devolução ao Poder Executivo da MP Medida Provisória nº 1.202/2023, visando sua republicação sem os itens que tratam da desoneração da folha dos setores, respeitando decisão soberana do Congresso Nacional.
A desoneração da folha é uma importante política pública com amplo apoio Congresso Nacional. Por iniciativa do Poder Legislativo, o PL 334/2023 foi apresentado e respeitou todos os trâmites, permitindo o devido debate. Com a derrubada do Veto 38 pela grande maioria dos parlamentares, a Lei nº 14.784 de 27 de dezembro de 2023 foi promulgada.
No dia seguinte após a promulgação pelo Congresso Nacional da Lei nº 14.784 foi editada a MP 1202/2023 que, entre outras medidas, ?revoga? a referida Lei. Na prática a Medida Provisória está sendo usada como uma forma de segundo veto não previsto na Constituição Federal. O Poder Executivo estaria ?derrubando a derrubada do veto?.
A Medida Provisória tem como finalidade promover ato doPoder Executivo com efeitos de lei por conta da natural demora do processo legislativo, em situação de relevância e urgência, e não para revisar uma lei que acaba de ser construída, dentro do rito correto e ampla discussão.
Caso o Congresso Nacional acate tal situação, isso poderia resultar em ampla insegurança jurídica, pelo uso de MPs em diversas outras situações nos mais diversos temas, esvaziando a competência do Poder Legislativo.
Diante disto, tomamos a liberdade de encaminhamos em anexo Nota Técnica do escritório Sacha Calmon Advogados que corrobora os argumentos acerca dos problemas e inconstitucionalidade da Medida Provisória 1202/2023 e que suportam a urgente devolução ao Poder Executivo para que possa, pelo menos, republicá-la suprimindo os trechos referentes à desoneração da folha dos setores.
Além da indignação dos setores, importante reforçamos também a grave insegurança e o elevado risco aos empregos durante eventual tramitação da MP. Diante do elevado aumento de carga tributária sobre o emprego de todos os setores contemplados, é provável que as empresas sejam forçadas a fazer ajustes em seus quadros e em seus investimentos, o que poderá provocar demissões em massa no primeiro trimestre de 2023.
Importante também lembrar que o Congresso Nacional, em 20/12/2023 publicou a Emenda Constitucional nº 132 (PEC 45/2019 da reforma Tributária), estabelecendo que o Poder Executivo deverá encaminhar em até 90 dias ?PROJETO DE LEI que reforme a tributação da folha de salários?. Este é o caminho adequado para discussão do tema, respeitando o devido processo legislativo.
Face ao exposto e diante da sensibilidade de V.Exa. à grave situação, solicitamos que o Congresso Nacional proceda a imediata devolução da Medida Provisória 1.202/2023, para sua adequação, afastando tamanha insegurança e os problemas que já está causando. Valemo-nos do ensejo para renovar as expressões do nosso maior apreço e consideração e subscrevemo-nos.
Atenciosamente,
- Abes ? Associação Brasileira das Empresas de Software
- Abert ? Associação Brasileira de Emissoras de Rádio e Televisão
- Abicalçados ? Associação Brasileira das Indústrias de Calçados
- Abimaq ? Associação Brasileira da Indústria de Máquinas e Equipamentos
- Abisemi ? Associação Brasileira da Indústria de Semicondutores
- Abit ? Associação Brasileira da Indústria Têxtil e de Confecção
- ABOL ? Associação Brasileira de Operadores Logísticos
- ABPA ? Associação Brasileira de Proteína Animal
- Abratel ? Associação Brasileira de Rádio e Televisão
- Abranet – Associação Brasileira de Internet
- Abrava – Associação Brasileira de Refrigeração, Ar Condicionado, Ventilação e Aquecimento
- ABT ? Associação Brasileira de Telesserviços
- Abrainc – Associação Brasileira de Incorporadores Imobiliárias
- ANER ? Associação Nacional de Revistas
- ANJ ? Associação Nacional de Jornais
- ANPTrilhos ? Associação Nacional dos Transportadores de Passageiros sobre Trilhos
- Assespro ? Federação das Associações das Empresas Brasileiras de Tecnologia da Informação
- Brasscom ? Associação das Empresas de Tecnologia da Informação e Comunicação (TIC) e de Tecnologias Digitais
- CBIC ? Câmara Brasileira da Indústria da Construção
- CICB ? Centro das Indústrias de Curtumes do Brasil
- Conexis Brasil Digital ? Sindicato Nacional das Empresas de Telefonia e de Serviço Móvel Celular e Pessoal
- CONTIC ? Confederação Nacional da Tecnologia da Informação e Comunicação
- FABUS ? Associação Nacional dos Fabricantes de Ônibus
- Fenaert ? Federação Nacional das Empresas de Rádio e TV
- Fenainfo ? Federação Nacional das Empresas de Informática
- Fenajore ? Federação Nacional das Empresas de Jornais e Revistas
- Feninfra ? Federação Nacional de Instalação e Manutenção de Infraestrutura de Redes de Telecomunicações e de Informática
- IGEOC ? Instituto Gestão de Excelência Operacional em Cobrança
- NTC&Logística ? Associação Nacional do Transporte de Cargas e Logística
- NTU ? Associação Nacional das Empresas de Transportes Urbanos
- OCB ? Organização das Cooperativas do Brasil
- P&D Brasil ? Associação de Empresas de Desenv. Tecnológico Nacional e Inovação
- SEPRORGS ? Sindicato das Empresas de Tecnologia de Informação e Processamento de Dados do Rio Grande do Sul
- Sinditêxtil ? Sindicato das Indústrias de Fiação e Tecelagem do Estado de São Paulo
- Sinicon ? Sindicato Nacional da Indústria da Construção Pesada
Fonte G1 Brasília