A 5ª Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, em São Paulo, negou por unanimidade o recurso da defesa de Sergey Vladimirovich Cherkasov, cidadão russo que é suspeito de atuar como espião e está preso em Brasília, para que ele fosse do regime semiaberto para o aberto. A Justiça Federal também não considerou “cabível” o pedido do réu para que fosse transferido a prisão que comporte o regime semiaberto para estrangeiros ou para a sede do consulado russo em São Paulo.
Segundo investigação da Polícia Federal, Cherkasov foi detido na Holanda, em abril de 2022, ao tentar entrar no país com um passaporte brasileiro em nome de Viktor Muller Ferreira. Ele planejava trabalhar no Tribunal Penal Internacional, em Haia, para investigar supostos crimes de guerra cometidos na Ucrânia. No país, ele foi preso preventivamente e denunciado pelo Ministério Público Federal (MPF) por uso de documento falso.
De acordo com o MPF, entre 2012 e 2022, Cherkasov usou documentos em nome de Viktor Muller Ferreira para entrar e sair do Brasil por 15 vezes. A primeira entrada do cidadão russo no Brasil aconteceu em 2010, ainda com a sua documentação original. Pouco depois, deixou o país já usando documentos em nome de Ferreira.
Recurso negado pelo TRF3
A decisão do TRF3 de negar o recurso (embargos de declaração) protocolado pela defesa de Sergey Vladimirovich Cherkasov é de segunda-feira (4). Segundo os desembargadores, o réu está preso desde 2 de abril do ano passado e, até a data da sentença em primeira instância, em 27 de junho, ele ficou preso provisoriamente por dois meses e 25 dias, o que resultaria pena em patamar superior a quatro anos e que não permite a alteração do regime semiaberto.
No julgamento, o tribunal afirma que o Supremo Tribunal Federal manteve a prisão do cidadão russo para extradição, “considerando a existência do presente feito e de inquérito deflagrado pela Polícia Federal em 11/05/2022 para apurações de possíveis atos de espionagem, lavagem de capitais e corrupção passiva” e que a decisão foi confirmada pela presidente da Corte, ministra Rosa Weber, em 29 de julho de 2023.
O governo brasileiro negou pedidos dos Estados Unidos e da Rússia para a extradição do russo. O pedido feito pela Rússia já foi autorizado pelo Supremo, mas só pode ser cumprido após a conclusão das investigações contra ele no Brasil. O próprio Cherkasov manifestou o desejo de ser extraditado para o país. A decisão do ministro Edson Fachin, entretanto, condicionava a entrega do suposto espião ao fim das investigações contra ele, feitas pela Polícia Federal, o que ainda não aconteceu.
Em relação à transferência para outra unidade prisional para o cumprimento de regime semiaberto, a Quinta Turma entendeu que é necessário mantê-lo no Complexo da Papuda, em Brasília (DF), “em razão do poder de influência do réu e de seus relevantes contatos fora do país, que transitou por diversos países com passaporte falso e se passou por outra pessoa por longo período de tempo sem ser descoberto”.
O acórdão diz ainda que o presídio federal pode assegurar ao réu melhores acomodações, “de modo a garantir direitos de areação, isolação, condicionamento térmico e alimentação adequados”, e que “não se mostra cabível a sua transferência para um estabelecimento prisional que comporte o regime semiaberto para estrangeiros ou o cumprimento de pena na sede do Consulado Russo em São Paulo”, como pediam os advogados do réu.
A defesa de Sergey Vladimirovich Cherkasov disse que estuda com seu cliente se entrará com outro recurso após o julgamento da 5ª Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região.
Em nota, o TRF3 informou que “os embargos de declaração foram julgados na sessão de 04/09, com acórdão unânime pelo não provimento. A Turma decidiu negar provimento aos embargos da defesa”.
Condenações
Em julho de 2022, Cherkasov foi condenado pela primeira instância da Justiça Federal a 15 anos de prisão. No entanto, ao analisarem o caso, os desembargadores do TRF-3 avaliaram que a pena em primeira instância foi muito alta e aplicaram a tese do crime continuado, baseados na previsão legal e na jurisprudência, e aglutinaram três conjuntos de crimes próximos, o que reduziu a contagem dos crimes praticados e influenciou na totalização da pena definitiva em 5 anos, 2 meses e 15 dias em regime inicial semiaberto.
As penas-base passaram de 1 ano, 1 mês e 15 dias para 1 ano e 3 meses, além de multa.
“Analisando o conteúdo de dois ‘pen drives’ e ‘chips’ de memória apreendidos em poder do réu, é possível observar que Sergey utiliza-se de técnicas de inteligência de Estado, tais como recrutamento de colaboradores, caixa morta, análises de cenários geopolíticos, comunicação deletada, uso de documentos falsos, conforme hipótese criminal, para sustentar uma robusta estória cobertura e relatórios para seu controlador”, justificou o colegiado.
A decisão reconheceu que o acusado cometeu o crime de uso de documento falso, do artigo 304 do Código Penal, ao utilizar três identidades falsificadas em diversas oportunidades:
- Um RG do Rio de Janeiro em junho de 2012 para ingressar no país a partir do Aeroporto Internacional de Guarulhos, na Grande São Paulo;
- Um passaporte para ingressar e sair do país entre 2013 e 2015;
- Um outro passaporte para ingressar e sair do país entre 2018 e 2022.
Na época da decisão do TRF3, a defesa alegava que Sergey está preso há 479 dias, que já havia cumprido um sexto da pena e que, por isso, o réu teria direito ao benefício da progressão para o regime aberto. A petição para progressão de pena foi feita para a Justiça Estadual de SP e também para o próprio TRF3.
No pedido ao TRF3, a defesa afirmou que a penitenciária de Brasília não possui o regime semiaberto e pede a imediata remoção do cliente a estabelecimento prisional que comporte o regime semiaberto para estrangeiros, ou na ausência deste, quefosse determinado o cumprimento da pena na sede do consulado russo em São Paulo.
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Fonte G1 Brasília